quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

DICIONÁRIO BRASILEIRO DE FRASEOLOGIA(UMA AMOSTRAGEM DO SEU ESTADO ATUAL)




José Pereira da Silva


As diferentes formas do “discurso repetido” da língua portuguesa ainda não foram organizados em coletâneas suficientemente amplas para que o pesquisador interessado possa obter um corpus representativo da literatura oral de nossa língua.
Entre os melhores trabalhos dedicados a esta faceta dos estudos da língua portuguesa, podemos citar o Adagiário Brasileiro (de Leonardo Mota), que inclui exemplos equivalentes de diversas outras línguas modernas e clássicas, o Tesouro da Fraseologia Brasileira (de Antenor Nascentes), que inclui explicações sobre a origem de algumas das expressões, o Dicionário de Locuções da Língua Portuguesa (de Euclides Carneiro da Silva), que inclui uma excelente exemplificação do uso dessas locuções em obras literárias brasileiras e portuguesas, o Novo Dicionário de Termos e Expressões Populares (de Tomé Cabral), talvez o mais volumoso trabalho impresso referente ao assunto, que inclui o significado e boa exemplificação do seu emprego em trabalhos de literatura popular brasileira, principalmente nordestina, além de muitos outros, incluindo entre eles uma série de teses de doutorado e dissertações de mestrado que tratam de parcelas desse material.
Na verdade, mais de uma centena desses trabalhos teria de ser consultada para que o pesquisador pudesse obter um corpus significativo de suas diversas formas estruturais e de suas diversas variantes geográficas, cronológicas etc.
O que estamos fazendo, talvez não tenha sido feito até agora porque não traz nenhuma evidência para o seu autor, visto que parece desprezível o trabalho de um pesquisador que se resume em fazer o levantamento de um corpus para que outros possam realizar estudos mais particulares e academicamente mais valorizados sobre a expressividade popular de uma língua.
Outro problema para o organizador de um trabalho desses, talvez dos mais difíceis, é a sua forma final de apresentação, visto que as numerosas pessoas que escreveram sobre o assunto seguiram padrões totalmente diferenciados. Uns, por exemplo, apresentam farta abonação de cada verbete, enquanto que outros nem se preocupam com isto; uns apresentam exemplos de obras literárias stricto sensu, enquanto que outros se valem apenas da literatura de cordel e similar; uns têm grande preocupação lexicográfica e / ou histórica, apresentando o significado de cada expressão ou locução e a história de sua origem e evolução, enquanto outros apenas relacionam tais elementos numa determinada ordem, que também não é sempre a mesma. Enfim, todos trazem alguma contribuição importante, mas trazem também mais uma parcela de dificuldade: Como apresentar material tão diversificado numa única forma? Está evidente que os críticos terão um prato cheio para tecerem todos os tipos de comentários maliciosos, caso não atentem para o fato de que o nosso trabalho não pretende ser um estudo conclusivo, mas apenas a apresentação “organizada” de um material difícil de ser reunido em qualquer biblioteca.
Apesar de não ser um problema específico da língua portuguesa, mas de todas as línguas e de todas as literaturas, precisamos buscar a definição e a classificação mais precisa possível para cada um dos diversos tipos dessas expressões lingüísticas, para que elas possam ser melhor estudadas, conhecidas e utilizadas pelas pessoas cultas, nas ocasiões em que elas se tornarem convenientes e necessárias.
Segundo já prometemos no III Encontro Interdisciplinar de Letras e no VII Encontro da Associação das Universidades de Língua Portuguesa, classificaremos tais expressões em dois grupos, segundo o nível lingüístico que apresentem: a nível de texto e a nível de sintagma. Ao nível de texto, encontramos os provérbios, os ditados, os refrães, os adágios, as máximas, as sentenças, os aforismos, etc. Ao nível de sintagma, encontramos as “perífrases léxicas”, segundo terminologia de Coseriu, incluindo aí todas as expressões fixas inferiores à oração.
Consideraremos “discurso repetido” qualquer tipo de expressão fixa cujos elementos não sejam substituíveis segundo as regras atuais da língua, importando, principalmente, o seu conceito de “expressões pré-fabricadas”i que ficam alheias à técnica do discurso propriamente dita.
As expressões fixas em nível de texto são todas as que correspondem a uma unidade com sentido completo, em qualquer nível de complexidade. Podem corresponder a uma oração, a um período e até a uma unidade mais complexa.
As expressões fixas em nível de sintagma são todas as que estão abaixo do nível da oração, unidades combináveis na oração e comutáveis com sintagmas e com simples palavras, cuja interpretação se faz ao nível do léxico,ii funcionando como unidades léxicas, pouco importando o número e a complexidade dos elementos constituintes discerníveis.
Dada a flutuação por que passa essa terminologia, não é nada fácil definir os diversos tipos dessas “expressões fixas” para se poder apresentar uma tentativa de classificação definitiva.
Para que se possam entender bem as dificuldades dessa classificação, sugerimos a leitura de nosso artigo, “A Classificação das Frases Feitas de João Ribeiro”, publicado nos Anais do III Encontro Interdisciplinar de Letras, p. 191-200, em 1992.
Antes dessa futura definição e classificação, é preciso organizar (e é isto que estamos fazendo, em forma de um Dicionário Brasileiro de Fraseologia), em forma de um “banco de dados”, que incluirá o maior número possível desses aforismos, anexins, apólogos proverbiais, apotegmas, ditados, ditos, exemplos, expressões, frases feitas, gírias, giros, locuções, máximas, modismos, parêmias, pensamentos, prolóquios, provérbios, refrães, refréns ou rifões, sentenças etc. de modo a facilitar a próxima tarefa dos pesquisadores que se interessarem por essas formas populares de linguagem humana.
Esse dicionário não pretende excluir de seu corpus as expressões de “discurso repetido” de origem externa, desde que tenham sido registradas alguma vez por autor brasileiro ou flagrada na fala corrente em algum lugar do Brasil. Só posteriormente ele poderá ser ampliado para abarcar as formas de “discurso repetido” da língua portuguesa em geral, visto que não temos acesso à bibliografia atualizada e / ou rara dos demais países lusófonos.
Neste momento, nosso trabalho já conta com um volume considerável de material coletado e digitado, com 658 páginas digitadas no formato de papel A4, margens de 2 cm., em caracteres “times new roman” de tamanho 10, em duas colunas, que imprimimos para servir de base para a continuidade do trabalho, visto que já é menos incômodo levar o impresso para casa (no caso dos estagiários) do que se deslocar para o ambiente em que estão os computadores com os textos, principalmente se considerarmos que somente um em cada dezena de registros encontrados aparece como novidade ou contribuição nova.
Em princípio, estamos adotando a disposição dos verbetes oferecida por Antenor Nascentes no seu Tesouro da Fraseologia Brasileira, como forma preliminar de uniformidade da apresentação do trabalho, prometendo estudar maneiras de aperfeiçoá-la:
1- Havendo substantivos ou palavras substantivadas, neles é feita a indicação;
2- Seguem-se em ordem de preferência verbo, adjetivo, pronome e advérbio;
3- Existindo duas palavras da mesma categoria, a primeira tem preferência;
4- Os substantivos pessoa e coisa, o pronome alguém, quando não são parte essencial da expressão, não se levam em conta, assim como os verbos auxiliares;iii
6- Dentro do verbete, as expressões são colocadas em ordem alfabética, começando pelas que se iniciam pela palavra-chave.
Entre parênteses, indicamos a fonte de consulta e/ou de abonação apresentada, exceto as que provêm do Tesouro da Fraseologia Brasileira, de Antenor Nascentes, ou do Adagiário Brasileiro, de Leonardo Mota, tomados como nossos textos de base para as contribuições a nível lexical e a nível textual respectivamente.
Neste momento, ainda estamos na fase de reunir os dados fornecidos pelas obras mais importantes de que dispõe a literatura especializada sobre o assunto, tendo utilizado o auxílio de duas estagiárias na digitação do material recolhido (Adriana Siqueira Monteiro e Andréa Virna Fernandes Pinheiro), proporcionando-nos um volume substancial de informações informatizadas, que pretendemos concluir até o final deste ano, se contarmos com outros tantos estagiários ou bolsistas de Iniciação Científica, como pretendemos.
Podemos garantir que o corpus que já temos organizado equivale a quatro ou cinco vezes o volume de qualquer uma das obras mais conhecidas e recomendadas entre nós, com possibilidade de ainda dobrar este volume até o final do trabalho. Dependendo disso, talvez apresentemos o resultado final em dois volumes: um com as expressões que atingem o nível de texto, como são os provérbios, por exemplo, e outro com as expressões que não atingem este nível, que constituem as locuções, a nível de sintagmas.
Enfim, o que pretendemos mostrar neste número da Revista Philologus é uma amostragem da fraseologia brasileira, através do material até então recolhido, apresentando o verbete cão, a título de exemplificação deste trabalho que ainda está em andamento.
Se utilizássemos a palavra cão e todas as suas variantes semânticas, sem a preocupação específica com o vocábulo cão, teríamos uma infinidade de outras construções, pois é muito comum a utilização de nomes de animais, principalmente de animais domésticos, nas construções populares que são o tema deste trabalho.
Pedimos que os interessados esperem um pouquinho, pois estaremos colocando esse material à disposição dos estudiosos muito brevemente.
De qualquer maneira, quem estiver interessado e com urgência sobre o assunto, escreva-nos uma cartinha que teremos o maior prazer em contribuir no que for possível.
CÃO
Cão coxo. O demônio. “Houve um samba tão grande no inferno que o Cão Coxo quebrou a outra perna” (AFE 117). “As que raspam sobrancelhas / e fazem com tinta preta, / Satanás manda Cão Coxo / espetar na baioneta” (LC-290 4). “A torcida de Satanás / diz que o jogo está perdido, / porque Cão Coxo não joga, / Satanás está contundido” (LC-776 2). “Pras profundas do inferno / Roberto foi rebatado, / para servir de cavalo / pra Cão Coxo andar montado” (LC-1020 16).
Cão da chaminé. Utensílio de ferro que ampara a lenha que arde na lareira.
Cão d’água. O mesmo que podengo d’água.
Cão de arame. Homem que parece um boneco. (AC)
Cão de fila. Pessoa que acompanha outra para todo o lado, a fim de protegê-la contra perigos eventuais. Segundo ABH, é o que, pela sua braveza, é utilizado como guarda de prédios.
Cão-do-mar. Peixe seláceo (CA).
Cão-do-mato. Cachorro-do-mato (CA).
Cão dos alanos. Alão (AC).
Cão do(s) inferno(s). 1) Expressão insultuosa. “Tenho fé em Deus, cão dos infernos, que...” (PBC 56). “Negro nojento! Macho desgraçado! Cão do inferno!” (CPS 67). 2) Pode encerrar também expressão de elogio. “... era o cão do inferno no riscado de um tango” (SSS 38).
Cão-hiena. O mesmo que hienóide (CA).
Cão-marinho. O mesmo que peixe-cão (CA).
Cão-miúdo. O diabo (ABH).
Cão pequeno. Lulu (AC).
Cão que ladra não morde. Pessoa que fala muito e ameaça, não é capaz de fazer mal (CA).
Cão que ladra, guarda-te dele.
Cão selvagem. Dingo (AC).
Cão sem dono. Criança ou jovem, sem proteção, sem assistência. “... pensa que eu sou cão sem dono” (JCP 70).
Cão-tinhoso. O diabo (ABH).
A cão mordido todos chicoteiam.
A cão mordido todos o mordem.
Acordar o cão que dorme. Estimular o inimigo que estava quieto; bulir em coisas que estavam esquecidas e de que pode resultar mal; suscitar idéias, lembrar coisas perigosas.
Agüentar o que o Cão enjeitou. Passar por terríveis sofrimentos (TC).
Casa do cão. O inferno (TC).
Cavalo do cão. Menino irrequieto. Conquistador afoito e irreverente. “Não me vá na viagem bancar o cavalo do cão pra cima da mulher alheia” (BMV 80). Inseto himenóptero que, à época da postura, sai à procura da aranha caranguejeira. Diz-se que, quando a encontra, entra logo em luta, que muitas vezes se prolonga por horas. O cavalo do cão só consegue dominar a aranha quando a fere em certo ponto nevrálgico, deixando-a paralisada. Deixa, então, os ovos no abdômen do animal vencido, onde eles são chocados, transformando-se, depois, em larvas. Estas, por sua vez, vão-se alimentando da carne da aranha que, aos poucos, vai morrendo. O cavalo do cão põe também no corpo de lagartas (TC).
Com o cão nos couros. Com o maldito nos couros, com o diabo nos couros. Possesso. Muito irado, furioso. Com maus instintos. “Parece que andava com o cão nos couros” (MLV 174). “Este moleque anda com o cão nos couros” (CPS 113).
Como o cão. Expressão comparativa, de sentido desagradável. “Feio como o cão” (JAD 79).
Dar a língua aos cães. Renunciar a explicar alguma coisa (CA).
De cão. Desagradável, infeliz, horrível, triste, intolerável. “Passara uma noite de cão” (JAD 39). “Isso não é vida. É vida de cão!” (TC).
Do cão. De cão. “Deu um azar do cão” (MLV 170). “Ia ser uma desorganização do cão” (JFJ 107).
É o cão. Expressão que tem múltiplas aplicações, com sentidos de revolta, admiração, entusiasmo, censura, dificuldades etc. Pode referir-se a uma pessoa ou coisa. “Moça do mato é o cão” (MOD 125). “Trabalhar de graça para os outros é o cão”. “Vai ser o cão quem me faça esse favor”. “Mas a bicha (uma porca) é o cão!” (MLV 141). “Com um gesto de cabeça, disse: foi o cão!” (OCR 139). “O caboclo estava perto, / vendo a destruição / disse: oh! José danado! / Aquele moço é o cão” (LC-306 21). “O povo todo dizia: / -- o sertanejo é o cão, / onde encontrava pegava, / era uma admiração” (LC-316 11). “Disseram para o doutor: / -- aquele moço é o cão, / quase nos mata agora / somente com um bofetão” (LC-818 29).
É um cão que tem no inferno. Réplica a quem emprega uma palavra ou expressão errada, como crítica a esse erro: “Levou ele “é um cão que tem no inferno” (JCN 213).
Enquanto o cão esfrega o olho. Em poucos instantes; num ápice. Quando menos se espera. “Se fizesse força, o veneno ganhava o sangue, enquanto o cão esfregava um olho” (JCA 210).
Entre o cão e o lobo. A boca da noite, ao lusco-fusco; no crepúsculo (AC). Com o entendimento pouco claro, um tanto toldado. “E às horas do meio-dia andar entre o cão e o lobo” (Sá de Miranda) (CA).
Estar com o cão. Vir com o cão. Dá idéia de coisa terrível, implacável, furiosa (TC).
Farejar como um cão. Andar em busca de alguma coisa.
Feito (o) cão. Muito irado. “Mas às vezes a alma da velha vinha feito o cão, numa fúria do diabo” (MLV 41).
Fugir de alguém como de um cão danado. Evitar esta pessoa de todos os modos possíveis. Toda a gente tem medo de ser mordida por cão danado.
Ir com o cão. Estar com o cão, vir com o cão. Dá idéia de coisa terrível, implacável, furiosa (TC).
Levar vida de cão. Levar vida trabalhosa e miserável (CA).
Mal ladra o cão, quando ladra de medo (JT).
Morrer como um cão. Morrer desprezado, abandonado de todos.
Não há cão nem gato que o não saiba (JT).
Natureza do cão. Implicante, perverso, malvado. “Então tinha uns quatro negros / da natureza do cão, / que se havia de querer / comer um doce ou um pão, / queria antes dar um tiro / na cabeça de um cristão” (LC 287 2).
Nem os cães o querem. Diz-se de alguém ou de alguma coisa que para nada presta (CA).
O cão e o menino só vão aonde lhe fazem mimo (JT).
O cão é sujo... Advertência que corresponde a cuidado com as tentações. Diz-se também que o cão é sujo, quando se pretende advertir alguém do risco que importam certas imprudências, qual seja a de brincar com armas de fogo.
O cão em pintura de gente. O mesmo que ”o diabo em figura de gente” isto é, perverso, cheio de artimanhas etc. “Aquele Lucas foi o cão em pintura de gente” (TC).
Obra do cão. Artimanha. Coisa do diabo (TC).
Onde o cão perdeu a(s) espora(s) Lugar distante, de difícil acesso, atrasado, sem atrativos etc. “Esta terra é terra onde o cão perdeu a espora” (JCS 146).
Pintar o cão. Fazer diabruras, distúrbios. “Ela pintava o cão: sobrevoava as águas, roçando a correnteza” (MLV 163).
Pintura do cão. Diabrura, peraltice. “Por dinheiro, faria a pintura do cão” (LCF 128). “Rosnava e mordia, que era a pintura do cão” (RQC 120).
Pra que cão ou pra que diabo (interj.). Por que? Ex.: Home que não tem cavalo / Pra quê diabo compra peia? / Muié que não possui brinco, / Pra que fura as oreia?
Preso por ter cão, preso por não ter. Culpado, de qualquer modo, por fazer uma coisa, e por não fazê-la. Estar sobre domínio do arbítrio (MP).
Quando se amarravam cães com lingüiças (JT).
Que só o cão. Expressão comparativa semelhante a Como o cão, isto é, de sentido depreciativo ou desagradável. “A mulher que é galheira / só merece punição, / na rua qu’eu moro tem / chifrudo que só o cão” (LC-696 7).
Quem com cães se deita, com pulgas se levanta (JT).
Quem matou o cão foi o Baeta. Não sei quem teria feito isto. Baeta era um tipo de espingarda comumente usada por caçadores (MELO e SOUSA, Folclore da matemática, 231). LINDOLFO GOMES, Rev. Fil., IX, 25, faz preceder à expressão as palavras três vezes 9, 27, aventando uma origem italiana que não convence.
Sabem-no cães e gatos.
Ser como o cão com o gato. Diz-se das pessoas que estão sempre em briga entre si (CA).
Ser o cão em figura de gente. Ser peralta, desordeiro. “Era o cão em figura de gente” (PDC 124).
Sete cães a um osso. Muitos pretendentes a uma coisa só.
Sete cães e só um osso. Estar sob forte concorrência; muitos pretendentes concorrendo a uma única coisa (MP).
Sofrer o que o Cão enjeitou. Agüentar o que o Cão enjeitou. Passar por terríveis sofrimentos. “E assim, sofrendo tudo o que o Cão enjeitou...” (JSS 129).
Tempo em que o cão era menino. De tempos remotos, imemoriais. “Está visto que o falar é muito velho, ainda do tempo em que o diabo era menino” (OLE 33).
Ter arte com o cão. Ter pacto com o diabo, ser endemoninhado ou feiticeiro. “Aquilo tem artes com o cão” (PLC 150).
Ter parte com o cão. Ter pacto com o diabo, ser endemoninhado ou feiticeiro. “Houve até quem acreditasse naquilo, como se tivesse parte com o cão” (JBM 28).
Ter pauta com o cão. Ter pacto com o diabo, ser endemoninhado ou feiticeiro. “Aquele homem tinha pauta com o cão” (JCN 67).
Ter visto o cão. Estar mal humorado; estar assustado (MP).
Tratar (alguém) como (a) um cão. Dar-lhe muito mau trato.
Trinca cães a um osso. Muitos pretendentes (JT).
Um cão danado todos a ele (JT).
Vir com o cão. Estar com o cão. “Moço, a seca veio com o cão” (NLP 303). “O touro saiu pra fora, cumo quem vinha cum o cão!” (ZPS 63).
Virar (o) cão. Exasperar-se, enfurecer-se. “Eu me danando, viro o cão” (OAP 370). “Há quatorze anos casada / com o homem -- que só prestou / no começo do casamento -- o diabo se manifestou: / e Valdemar, em vez de atenção, / quebrava mesa, virava o cão!” (LC-62 2).
Viver como cão vadio. Não ter nem mesmo onde morar (MP).
Viverem como cão e gato. Em constante inimizade, brigando sempre, sem se poderem ver.
RESUMO
O Dicionário Brasileiro de Fraseologia será um repositório de expressões da literatura oral, representada principalmente pelos provérbios, e outras formas do denominado “discurso repetido” ou “frases feitas”. Exemplificamos com uma amostragem do verbete “cão”.
BIBLIOGRAFIAiv
ABH = Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa.
AC = Agenor Costa. Dicionário de Sinônimos e Locuções da Língua Portuguesa. (Suplemento). Rio de Janeiro: [Jornal do Commercio], 1952, 253 p.
AFE = Aderaldo Ferreira de Araújo. Eu Sou o Cego Aderaldo, cit. por TC.
NA = Antenor Nascentes. Tesouro da fraseologia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. XXII + 431 p.
CA = Caldas Aulete. Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa. 5 ed. Rio de Janeiro: Delta, 1970, 5 vol.
CPS = Caio Porfírio Carneiro. O Sal da Terra, cit. por TC.
Eugenio Coseriu. Principios de semántica estructural. Madri: Gredos, 1977, 247 p.
JAD = Jorge Amado. Dona Flor e Seus Dois Maridos, cit. por TC.
JBM = Juarez Barroso. Mundinha Panchico e o Resto do Pessoal, cit. por TC.
JCA = Jader de Carvalho. Aldeota, cit. por TC.
JCN = João Clímaco Bezerra. Não Há Estrelas no Céu, cit. por TC.
JCP = João Clímaco Bezerra. Sol Posto, cit. por TC.
JCS = Jader de Carvalho. Sua Majestade o Juiz, cit. por TC.
JFJ = João Felício dos Santos. João Abade, cit. por TC.
JSS = Jaime Sisnando. Sertão Bravio, cit. por TC.
JT = João Nepomuceno Torres. A Gíria Brazileira: coleção de anexins, adágios, rifões e locuções populares. Bahia: [s.e.], 1899, 234 p.
LC 62 = Abraão Batista. O Homem que Deixou a Mulher para Viver com uma Jumenta, cit. por TC.
LL 287 = João Cordeiro de Lima. Nogueira e Juscelino, cit. por TC.
LC 290 = João de Cristo Rei. Exemplo de um Rapaz que Morreu e Tornou, cit. por TC.
LC 306 = João Ferreira de Lima. Dois Glosadores, cit. por TC.
LC 316 = João José da Silva. História de Zé Mendonça, o Sertanejo Valente, cit. por TC.
LC 696 = José Costa Leite. Peleja de José C. Leite com Maria Quixabeira, cit. por TC.
LC 776 = José Soares. A Corrupção de Hoje em Dia, cit. por TC.
LC 818 = Luiz da Costa Pinheiro. História de Rosa Branca ou a Filha do Pescador, cit. por TC.
LC 1020 = Severino Carlos. O Orgulho de Roberto e a Queda da Maldição, cit. por TC.
LCF = Luís da Câmara Cascudo. Flor dos Romances Trágicos, cit. por TC.
LINDOLFO GOMES, Rev. Fil., IX.
Maria Imerentina Rodrigues Ferreira (Org.). III Encontro Interdisciplinar de Letras. Rio de Janeiro: UFRJ / Faculdade de Letras, 1992, 361 p.
MELO e SOUSA, Folclore da matemática.
MLV = Mário Landim. Vaca Preta e Boi Pintado, cit. por TC.
MOD = Manoel de Oliveira Paiva. Dona Guidinha do Poço, cit. por TC.
MP = Márcio Pugliesi. Dicionário de Expressões Idiomáticas. São Paulo: Parma, 1981, 309 p.
NLP = Nelson Lustosa Cabral. Paisagem do Nordeste, cit. por TC.
OCR = Odálio Cardoso de Alencar. Recordações da Comarca, cit. por TC.
OLE = Oswaldo Lamartine de Faria. Encouramento e Arreios do vaqueiro do Seridó, cit. por TC.
PBC = Pedro Batista. Cangaceiros do Nordeste, cit. por TC.
PDC = Paulo Dantas. O Capitão Jagunço, cit. por TC.
PLC = Péricles Leal. Caminhos da Danação, cit. por TC.
RQC = Raquel de Queiroz. O Caçador de Tatu, cit. por TC.
SSS 38 = Sinval Sá. O Sanfoneiro do Riacho da Brígida, cit. por TC.
TC = Tomé Cabral. Novo Dicionário de Termos e Expressões Populares. Fortaleza: UFC, 1982, 786 p.
ZPS = Zé Praxedi. O Sertão é Assim, cit. por TC.

NOTAS
i. Cf. COSERIU, E., (1977), p. 113 e SEVILLA, J. M., [s.d.], fl. 1ii. Cf. COSERIU, E., (1977), p. 116-7iii. NASCENTES, A., (1986), p. XXIII.iv. Relação das obras citadas como fontes ou como abonações, sem a ordem padronizada de bibliografias.


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